sexta-feira, 15 de setembro de 2006

O princípo do fim

Deitado no chão, olho para a única coisa que permanece intocada e eterna nestes dias: o Céu. Majestoso e imponente no seu azul, o Céu não é ameaçador mas belo, quase vaidoso, mostrando a todos nós, comuns e míseros mortais, tudo o que sempre tentámos alcançar mas onde nunca chegámos, por mais perto que julgámos estar. É neste cenário que tento decansar, onde tento por uma última vez sentir a vida que julguei ter um dia. Aqui jazo, sabendo que o tempo não está do meu lado, caminhando alheio á minha dor e ao meu sofrimento, anseando pela altura em que abandonarei o seu reino, a hora em que caminharei lado a lado com as almas que nunca descansarão. Não sei se a Morte se aproxima, ou se algum outro mistério da minha alma se prepara para me assombrar, mas sinto que o fim começou. Preparo-me para abandonar tudo o que conheci, tudo o que existe, e um vazio enorme instala-se dentro de mim, dando-me apenas um instante para me despedir. Nesse instante olho mais profundamente para o Céu, o lugar dos meus sonhos, onde o meu imaginário se perdeu muitas vezes em mundos perfeitos, em lugares sagrados. Choro pela saudade desses momentos, pequenos momentos de serenidade e de perfeição em que por instantes senti que tudo fazia sentido. Choro também por te perder, por não me teres deixado amar-te, por não me ter deixado ser amado... Nunca te tive e mesmo assim foste tudo o que conheci... Na solidão e na tristeza aprendi a conhecer-te, cada pequeno gesto, cada pequeno detalhe da tua alma fez sempre parte de mim, talvez fazendo com que este momento se demorasse. Mas abandonaste-me... Deixaste-me aqui para ser preenchido pelo vazio e pela escuridão. Não quero partir, mas ao mesmo tempo não tenho razões para ficar, apenas o Céu faz força para eu ficar, para que o olhe mais uma fez, e para que pense quão belo ele é... Mas é tarde, tenho de ir... Deixar tudo isto para trás, deixando o fim começar, e quem sabe, talvez um dia esse fim acabe e eu possa voltar ao início, nascer outra vez, e talvez aí possa olhar o Céu mais uma vez e perder-me nas profundezas da sua beleza...

quarta-feira, 13 de setembro de 2006

O abismo, refúgio e companheiro

Meu único refúgio. O único local onde me sinto seguro. Longe de tudo, longe de ti, longe de mim. Onde descanso no cansaço, onde recupero as forças que nunca tive e que nunca me acompanharam. Onde me torno a minha própria sombra, onde sei que não espero nada de mim próprio. É neste local onde enfrento a minha própria realidade, o meu próprio mundo. Aqui estou seguro, aqui estou sozinho. Aqui liberto a minha raiva e deixo o meu verdadeiro "eu" tomar conta de mim. A solidão, a tristeza, a dor, o desespero a vontade de desaparecer, de deixar de existir. Talvez sejam estes todos os sentimentos considerados horríveis e que nos causam mais sofrimento, mas é tudo o que tenho, tudo o que sou e por isso deixo-me abraçar e consumir por todos eles. A minha mente vagueia por locais assombrados, por abismos dentro do abismo. Aqui não há nada nem nunca houve nada. Ninguém lá foi nunca ninguém lá irá sem ser eu. Tudo isto me faz sentir verdadeiro, como se a dor fosse a única coisa que alguma vez me tocou. Não escolho este local por ser diferente da realidade: tudo o que sinto aqui é um reflexo mais nítido do que sou. Mas aqui tudo faz sentido, é normal sentir-me sozinho quando a solidão me rodeia, é normal sentir desespero quando a esperança nunca aqui esteve. É um conforto da realidade: os sentimentos negativos fazem sentido. Estarei sempre aprisionado neste local, neste inferno infinito. Aqui ficarei, aqui existirei... Para sempre sentindo a tua falta, tu que nunca exististe, tu que eu amei, tu que atormentaste o meu ser durante anos... Fruto da minha imaginação foste o melhor que tive em toda a minha vida, e ainda assim foste tu que me conduziste á desgraça... Estou aprisionado neste abismo por existires. Estarei sempre aqui, nunca esperando que regresses do local para onde nunca foste... Volta, quero-te comigo... Sei que nunca estiveste comigo, sei que fiquei louco pela tristeza mas és tudo o que tenho... És a razão do meu chorar, das minhas lágrimas eternas, lágrimas vazias, estranhas para mim próprio... Tu, Vida, fruto da minha mente, tormento imperceptível, agonia sincera... Desejo que nunca tenhas existido... Mas já nem sei se alguma vez exististe ou se sempre te imaginei... Fujo de ti neste abismo, mas tu segues-me para sempre, rindo-te da minha desgraça... Mas não te odeio... Adoro-te... Para sempre ficarás a meu lado sem me deixares tocar-te... Neste abismo te confronto, neste abismo esperarei que desistas de mim... que desapareças, deixando-me sozinho, como sempre me senti...