O princípo do fim
Deitado no chão, olho para a única coisa que permanece intocada e eterna nestes dias: o Céu. Majestoso e imponente no seu azul, o Céu não é ameaçador mas belo, quase vaidoso, mostrando a todos nós, comuns e míseros mortais, tudo o que sempre tentámos alcançar mas onde nunca chegámos, por mais perto que julgámos estar. É neste cenário que tento decansar, onde tento por uma última vez sentir a vida que julguei ter um dia. Aqui jazo, sabendo que o tempo não está do meu lado, caminhando alheio á minha dor e ao meu sofrimento, anseando pela altura em que abandonarei o seu reino, a hora em que caminharei lado a lado com as almas que nunca descansarão. Não sei se a Morte se aproxima, ou se algum outro mistério da minha alma se prepara para me assombrar, mas sinto que o fim começou. Preparo-me para abandonar tudo o que conheci, tudo o que existe, e um vazio enorme instala-se dentro de mim, dando-me apenas um instante para me despedir. Nesse instante olho mais profundamente para o Céu, o lugar dos meus sonhos, onde o meu imaginário se perdeu muitas vezes em mundos perfeitos, em lugares sagrados. Choro pela saudade desses momentos, pequenos momentos de serenidade e de perfeição em que por instantes senti que tudo fazia sentido. Choro também por te perder, por não me teres deixado amar-te, por não me ter deixado ser amado... Nunca te tive e mesmo assim foste tudo o que conheci... Na solidão e na tristeza aprendi a conhecer-te, cada pequeno gesto, cada pequeno detalhe da tua alma fez sempre parte de mim, talvez fazendo com que este momento se demorasse. Mas abandonaste-me... Deixaste-me aqui para ser preenchido pelo vazio e pela escuridão. Não quero partir, mas ao mesmo tempo não tenho razões para ficar, apenas o Céu faz força para eu ficar, para que o olhe mais uma fez, e para que pense quão belo ele é... Mas é tarde, tenho de ir... Deixar tudo isto para trás, deixando o fim começar, e quem sabe, talvez um dia esse fim acabe e eu possa voltar ao início, nascer outra vez, e talvez aí possa olhar o Céu mais uma vez e perder-me nas profundezas da sua beleza...