segunda-feira, 5 de julho de 2010

De que Céu?



De onde vieste tu? Como invadiste o meu ninho quando a solidão há muito partiu? Apenas sei que estar aqui não é estar, é ser. Não são os nossos lábios que se tocam, mas antes as suas almas que num beijo se confessam sem sentido. E perder o sentido é aceitar-te, não como desejo de morte, mas como ausência de uma finitude caminhante.
Sentes esta alma? Sente-la como eu sinto a tua? Ou a dormência do sonho em que estás cegou a tua pele? Espero apenas que não, a solidão traiu-me e tu estás aqui, estás aqui na minha respiração.
Estar aqui não é estar, é ser. E respirar-te não é viver, mas sim sofrer o beijo que por não chegar me aperta. Me aperta.
Olho a solidão nos olhos, mas não nos olhos que me vêm, e peço-lhe que me deixe sofrer este beijo. Se a solidão me mente, se sou apenas absinto na sua mente, aceitas sofrer? Aceitas-me?
Porque caí eu no chão? Sei voar, estive a voar. O salto era apenas o toque que precisei oferecer ao ar. Mas no final, no final que de mim nasceu, o ar não me chegou. E partir o chão com aquele fardo tão invisível foi o fado que em mim coube. Mas nada em mim doeu. Nada doeu...
Não posso assombrar o anjo do destino. Se ao nascer apenas senti um espelho, não queimaria eu as minhas asas se a mim me afogasse? E que movimento me resta se do outro lado apenas eu me olho, de asas queimadas, sem nenhuma sina?
Que desígnio, que movimento? E porquê movimento? Se me desnudaram a solidão, porque não levam também esse movimento? Perpétuo, eternamente perpétuo é o que desejo ser quando vivo naqueles pesadelos.
E tu, porque estás aqui? Porque estás ainda aqui? Serás tu meu espelho partido, onde o reflexo sou apenas eu, e não reflexo? Deixa-me sofrer o beijo, deixa-me sofrer.
Não me olhes solidão, não me vejas. Ouve apenas as palavras de amor que entre linhas brilham.

Caixa Infinita


É neste espaço pequeno que guardo o mundo. É nesta pequena caixa invisível que te toca, que te ama, que guardo o meu mundo. Aqui mesmo, onde o Nada não se ouve, mas se sente infinito, guardo este pequeno mundo. Neste espaço.
Não, aqui não falarás de tempo, essa morte não cabe nesta caixa, essa morte não abraça o infinito. Não, nesta caixa não te ouvirás, nunca no infinito caberá a dor que nasce, apenas na morte. Ao ser tempo, essa dor não cabe num espaço, não neste espaço.
Porque guardo então esta caixa? Aqui não cabe o tempo, ou a dor, que tão humanos nos fazem. Porque quero então o mundo se nem dor, nem tempo, nem morte, lhe dão cor? Porque sei que esta caixa é infinita. Porque sei que, não sentindo nela consciência abraço a existência, que melancólica nunca nasceu em ilusão.
Não, não é por ser uma caixa que este espaço tem um fim. Não, não é ilusão. O infinito não compreende um tempo sem fim, apenas um espaço sem fim. A vida não morre por não ter onde brincar, morre por não ter mais quando brincar. E não morrerá nunca o parque onde brincou a semente, apenas lhe roubarão o Sol. Assim, mesmo quando o tempo não termina, ele continuará caminhando. E nada será infinito na essência, apenas permanentemente progressivo.
Roubei o tempo ao mundo que neste espaço pequeno guardo. Roubei-o. Agora o mundo é apenas este local, esta caixa, e nada muda, nada caminha. O Nada não morre, não envelhece, nunca.
Entra comigo nesta caixa, vem sentir o que te conto. Anda perder-te neste infinito imutável onde a tristeza ganha estranha tranquilidade. Não, não sairás. Não, não morrerás. Não, não sentirás dor.
Apenas serás infinita.